segunda-feira, 26 de maio de 2014

Analisando o conto "O Enfermeiro", de Machado de Assis



"O Enfermeiro" é um conto escrito em primeira pessoa, na fala de Procópio, o enfermeiro do bravo Coronel Felisberto, que muito adoentado, brigava com todos os enfermeiros que tivera. Em um dos ataques de fúria de Felisberto, Procópio acaba matando-o. A morte do Coronel é disfarçada, mas o enfermeiro não esperava que a fortuna de Felisberto fosse destinada a ele, já que o Coronel não tinha parentes.

No conto, Machado de Assis traz a sua característica crítica ao homem, tendo uma visão pessimista. Procópio é um homem que havia suplantado seu instinto e matado o velho Felisberto. Porém, em seguida, sente o remorso e começa a enxergar qualidades boas no Coronel, um sádico, que maltratava-o quase todo o tempo.

Também é possível perceber que Procópio parece arrependido do ato. Ainda assim, fica com boa parte da herança, doando trinta e dois contos de réis à caridade, Santa Casa de Misericórdia.
Matheus Nachtergale e Paulo Autran na adaptação
de "O Enfermeiro" para o cinema, em 1999. 

Nos livros "Memórias Póstumas de Brás Cubas" e "Dom Casmurro", os protagonistas relembram suas vidas após os acontecidos. No caso de Brás Cubas, após a morte. Isso parece ser uma característica machadiana, pois Procópio está prester a falecer quando relembra o caso do assassinato.

Podemos perceber também que Procópio tenta racionalizar o crime, que teria sido fruto sem dolo de um desentendimento. Em um primeiro momento, o personagem se vê como um assassino. Depois, Procópio começar a enxergar justificativas para o crime.

É interessante identificar a ironia de Machado ao construir o personagem Procópio. Ele odiava o Coronel Felisberto devido à fúria incessante do velho, mata-o e, no entanto, recebe a herança. É uma crítica irônica.

Analisando o conto "A Igreja do Diabo", de Machado de Assis



O ser humano sempre se contradiz. Essa é a definição que podemos tirar do conto "A Igreja do Diabo", de Machado de Assis. Aqui, Machado faz uma ácida sátira crítica às religiões, aos seus fiéis e à natureza humana em geral, uma marca do Realismo brasileiro e em especial, da obra machadiana.

A diferença entre Deus e o Diabo é a seguinte: o Diabo nega tudo, Deus não. Porém, ambos usam de sua retórica para convencer os demais, uma habilidade da espécie humana: a arte de convencer.


Em 1884, o Brasil estava dividido entre monarquistas e republicanos. Haviam aqueles que defendiam o Imperador Dom Pedro II, porém outros acreditavam na república expressa pelos ideais do positivismo de Augusto Comte. Machado critica também a Igreja Católica, que era uma das bases do regime monárquico, que teve sua história marcada pela venda de indulgências em busca da salvação eterna de seus fiéis.

Também é preciso destacar a forma com que o Diabo transforma suas teorias para torná-la atraente ao público. Ao pensar no benefício do fiel, que não precisaria justificar seus atos, ao contrário do Cristianismo, é uma grande ideia do Diabo para agregar o maior número possível de fiéis. Seria uma analogia à venda de indulgências, afinal bastando dar o dinheiro e comprando algo, você já teria seu lugar no céu, sem mais justificativas. Atualmente, esse fenômeno ocorre também nas igrejas neo-pentecostais.

Porém, a crítica central do conto recai nas contradições do homem, que cai em contradição. Quando no cristianismo, comete os pecados do cristianismo e o homem é uma figura avarenta, gulosa, invejosa. Na igreja do Diabo, o homem também comete pecados, desta vez segundo a doutrina do Diabo: amar o próximo, acolher, ajudar.

Machado de Assis prova que o homem é um ser dúbio e que sempre é guiado pelo seu instinto, independente da religião que professa. Quando não pode exercer o mal, exerce o mal e, quando não pode exercer o bem, exerce o bem.

terça-feira, 20 de maio de 2014

Reescrevendo Machado de Assis

ITALO FILHO

Durante o mês, uma polêmica circulou na imprensa, envolvendo reescritas da obra do imortal escritor Machado de Assis. A revista Exame publicou a seguinte matéria em 05 de maio:

Obra de Machado de Assis é reescrita para facilitar leitura
Luciana Carvalho, Exame, São Paulo, 05 mai. 2014.

São Paulo – Para incentivar os jovens a ler as obras dos principais autores da literatura brasileira, uma escritora criou um projeto controverso. De acordo com o jornal Folha de São Paulo, Patrícia Secco lançará em junho uma versão do livro “O Alienista”, de Machado de Assis, com linguagem mais fácil, frases diretas e palavras comuns.

O plano abarca trabalhos de outros grandes autores, como José de Alencar, cujo livro “A Pata da Gazela” também será lançado em junho. A verba para colocar a ideia em prática veio de patrocínio da lei de incentivo, com autorização do Ministério da Cultura.

Se Patrícia conseguir captar mais dinheiro, outros títulos poderão ser “mastigados”, como “O Cortiço”, de Aluísio Azevedo, e “Memórias de um Sargento de Milícias”, de Manuel Antônio de Almeida.

Segundo a Folha, ela alega que, apesar de a linguagem ser descomplicada, o estilo dos autores não será modificado. Os 600 mil exemplares dos livros que sairão no próximo mês devem ser distribuídos gratuitamente pelo Instituto Brasil Leitor.

Mesmo com a intenção de popularizar a leitura, a ideia gerou polêmica nas redes sociais. No Twitter, o tema foi parar nos “trending topics” do Brasil, nesta segunda-feira, com alguns defensores e muitos críticos ferrenhos.

Entre os defensores, o argumento é de que o gosto pela leitura poderá ser estimulado. Já quem não gostou da ideia afirmou que adaptar uma obra dessa forma não aprimora os conhecimentos do leitor, que pode recorrer ao dicionário, e ainda prejudica o trabalho do autor original.

No dia anterior, o colunista do jornal Folha de São Paulo, Chico Felitti, havia publicado a informação:

Escritora muda obra de Machado de Assis para facilitar a leitura
Chico Felitti, Folha de S. Paulo, São Paulo, 04 mai. 2014.

"Entendo por que os jovens não gostam de Machado de Assis", diz a escritora Patrícia Secco. "Os livros dele têm cinco ou seis palavras que não entendem por frase. As construções são muito longas. Eu simplifico isso." Ela simplifica mesmo: Patrícia lançará em junho uma versão de "O Alienista", obra de Machado lançada em 1882, em que as frases estão mais diretas e palavras são trocadas por sinônimos mais comuns (um "sagacidade" virou "esperteza", por exemplo".

A mudança não fere o estilo do escritor mais celebrado do Brasil, diz Patrícia. "A ideia não é mudar o que ele disse, só tornar mais fácil."

E o plano inicial dela era descomplicar outros clássicos. A ideia nasceu em 2008, com aspirações maiores: "Montei um plano com um título de cada autor clássico para a gente tentar fazer uma versão."

Seu projeto, que também previa versões de "O Cortiço" e de "Memórias de Um Sargento de Milícias", foi liberado pelo Ministério da Cultura para captar dinheiro com lei de incentivo, mas Secco só conseguiu patrocínio para dois títulos: "O Alienista" e "A Pata da Gazela", de José de Alencar, que sai junto.

A equipe que "descomplica" o texto é formada "por um monte de gente", diz a autora, entre eles a própria e dois jornalistas amigos.

A tiragem, de 600 mil exemplares, será distribuídas de graça pelo Instituto Brasil Leitor. O lançamento será em junho, e terá direito a um túnel construído com 60 mil livros no vale do Anhangabaú, centro da cidade.

"É absurdo imaginar que a função da escola seja facilitar qualquer coisa, em vez de levar a trabalhar com as dificuldades da vida, da crítica e do conhecimento", comenta o professor da USP Alcides Villaça. Ele se diz indignado: "Apresentar como sendo de Machado de Assis uma mutilação bisonha de seu texto não devia dar cadeia?".

Outros seis mestres da USP e três da Unicamp foram procurados para dar seu parecer sobre o projeto. Nenhum quis comentar.

As opiniões foram muito diversas. "Lançar versões simplificadas de clássicos da literatura é uma prática comum em qualquer país do mundo. A inexplicável polêmica sobre a adaptação de O alienista para leitores jovens confirmou uma verdade tão antiga quanto a obra de Machado de Assis: a crítica literária brasileira tem o péssimo hábito de só abrir a boca para reclamar.", comenta Danilo Venticinque, da revista Época.

O jornalista Juremir Machado da Silva, colunista do Correio do Povo, em coluna publicada no último sábado, acredita que a obra de Machado de Assis não deva ser ensinada aos adolescentes, pois estes ainda não teriam a maturidade para o gênero machadiano. Marcelo Mirisola, do site Yahoo, compartilha da mesma opinião.

O escritor Luis Augusto Fischer, em artigo para o jornal Zero Hora do dia 18 afirmou: "Visto isso, é claro que sou favorável às adaptações, em regra. Sei que nunca se deve oferecer ao aluno, em qualquer nível, apenas aquilo que ele já conhece - e nisso me oponho a toda uma perspectiva que quer reduzir o repertório das aulas ao mundo já vivido pelo aluno, que deve ser apenas e tão-somente o ponto de partida da conversa. Sei também que se deve ajudar o aluno a inventar seu próprio caminho de aprendizado, por exemplo ensinando a usar o dicionário. Mas há uma diferença entre desafio saudável e barreira intransponível. Aqui entra em cena a adaptação."

Já outros comentários foram contra. José Maria e Silva, do jornal Opção, de Goiânia, defende que "em sua arbitrária simplificação de Machado de Assis, em que comete erros primários de interpretação de texto, a escritora-empresária Patrícia Secco embrutece o espírito do leitor ao falsear o mestre e descaracterizar seus personagens.". Em reportagem de Meire Kusomoto, a revista Veja também critica as adaptações feitas por Patrícia Secco.

Fontes consultadas:
https://br.noticias.yahoo.com/blogs/marcelo-mirisola/menos-machad%C3%A3o-222704374.html
http://veja.abril.com.br/noticia/celebridades/de-machado-de-assis-a-shakespeare-quando-a-adaptacao-diminui-obras-classicas
http://exame.abril.com.br/estilo-de-vida/noticias/obra-de-machado-de-assis-e-reescrita-para-facilitar-leitura
http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/proa/noticia/2014/05/a-polemica-sobre-a-versao-facilitada-de-machado-de-assis-4502832.html
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/cidadona/2014/05/1445858-escritora-muda-obra-de-machado-de-assis-para-facilitar-a-leitura.shtml
http://www.jornalopcao.com.br/reportagens/discipula-de-paulo-freire-assassina-machado-de-assis-4399/
http://epoca.globo.com/colunas-e-blogs/danilo-venticinque/noticia/2014/05/machado-de-assis-e-bchoradeira-dos-criticosb.html
Juremir Machado da Silva. Correio do Povo, 17 mai. 2014, p. 2.